sábado, 26 de fevereiro de 2011

Acordar em Serpa é um Sonho Bonito


Que sossego! Que bom que é acordar sem pressa para nada e ouvir galos, pássaros, pica-paus, cascos de cavalo a trotar, o cata-vento a ranger. Que bom que é fechar os olhos novamente e, sem pressas, voltar a adormecer embrulhada em sonhos cheios de todos estes barulhos e outros tantos. Que bom que é encontrar nestes sonhos as cores fortes do campo, as misturas sem preceito de todas elas sem qualquer preocupação estética. Que bom que é ter sonhos cheios de boa disposição e bem-estar. Que bom que é sentir paz interior, respirar fundo e calmamente sentir que a respiração, finalmente, tem o mesmo ritmo que os pensamentos e que os estados de ansiedade diminuem a cada minuto. Que bom que é sentir o cheiro quente das flores durante o dia e o fresco do anoitecer. No Alentejo a noite cheira a estrelas o dia cheira a sol. É muito característico desta minha terra a mistura do quente e do frio, nota-se nos cheiros, no corpo, nas cores. Não há nada como acordar por aqui.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Recordações


Hoje fui “obrigada” a rebuscar coisas que ainda estão lá atrás meio desarrumadas.

Digo desarrumadas, porque ainda não tive a coragem de lá ir arrumar, ver os estragos efectivos, pôr de pé as sobras, apanhar os cacos e deita-los fora. Às vezes prefiro fingir, tapar para não ver, passar de costas.
Ainda não me sinto preparada para abrir os olhos, ouvir e sentir, ainda sinto a terra movediça e traiçoeira.

A verdade é que tenho alguma dificuldade em enfrentar e aceitar as minhas perdas, em fazer o meu luto, em atirar para trás das costas sem qualquer problema, partes da minha vida que nunca mais voltarão. Luto até mais não, contra marés e ventos, para não perder os fios condutores da minha felicidade, do meu alinhamento emocional, da minha estabilidade e equilíbrio. De facto sinto que não fui educada para encerrar capítulos, fechar portas, por pontos finais, etc e tal e outras coisas que tenham a ver com Adeus, Até breve, Até logo. Até mesmo um simples Até Amanha me faz um calafrio na espinha. A verdade é que me custa acabar com qualquer coisa que seja na minha vida,  até os cremes das mãos com restos já rançosos e secos, praticamente no final do final ficam eternidades nas gavetas à espera de dias de convicção e coragem.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Um sonho/Um pesadelo


Às vezes tenho medo de dar azo aos meus pensamentos. Eles voam e viajam muito para além do razoável. Cavam um poço grande entre o que sou e o que eu queria e gostava de ser, entre o que tenho e o que eu gostaria de ter, entre o que eu amo e como eu gostaria de ser amada. Mas é inevitável, não consigo parar o vento que os forma, assim como não consigo parar a razão que os destrói e os faz cair. É um trabalho feito em duplicado, executado e cumprido na totalidade por mim!

Voar é um sonho bonito, cheio de cor e musica, é quente, é sorriso, é bronzeado, é verão, é leve, é dança, é amor, é solto, é sem destino, é loucura, é luar, é brilho, é vinho, mar azul, filme que acaba bem, é um nunca alcançar de tão bom.
Depois vem o deitar a baixo este sim é o pesadelo, é duro, é lágrima, é frio, é feio, é destrutivo, é cair, é partir, é perder, é perceber e encarar a realidade bem de frente.

É uma guerra fria que não acaba nunca, quanto maior é um, maior é o outro e eu não sei o que sei fazer melhor, se voar se deitar a baixo e cair

Penso à semelhança daquilo que sou, sonho na parecença daquilo que dou, destruo na medida do que nunca tive, caio em cima de tudo o que tenho e desdenhei.

Arre! Que a miúda é loira…


E Click! Alguma coisa mudou em mim nestes dias.
Não sei muito bem o quê mas que mudou, mudou! Ainda não me apercebi do alcance desta mudança. Não percebi o que a despoletou, nem tão pouco quais as repercussões e as consequências. Mantenho-me atenta, sei que todas as mudanças têm coisas boas e más.

De uma coisa sei. Respirei fundo e senti-me mais leve. Acho que uma das coisas que me deixou mais ligeira foi ter percebido que há coisas que não pagam a nossa falta de sono, o nosso desassossego. Basta por isso decidir o que queremos para saber o que não queremos ou o contrario, decidir o que não queremos para saber o que queremos.

Custou chegar até aqui! Arre, que a miúda é loira…

Certo é que depois de toda esta mudança, voltou um bocadinho da paz interior que um dia eu tive e com ela a vontade de voltar a ouvir as minhas musicas de eleição.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Coisas da vida


Um dia uma tia minha, escritora, leu umas coisas que eu escrevi e disse que gostou de ter lido. Falou pouco e a crítica foi mais ou menos, e do que me lembro, que eu tinha uma escrita de leitura fácil, tipo Margarida Rebelo Pinto, e rematou – Está muito na moda!

Fiquei a matutar. Não percebi se foi uma crítica boa ou má. Ou por outra, percebi sim. A crítica foi uma boa crítica, só não sei se gostei de a ter ouvido ou se preferiria ter ouvido que o meu estilo de escrever era francamente mau.


Não pretendo ser escritora de forma alguma. E se tiver, algum dia, uma dessas pretensões internem-me por favor. Tal como esta minha Tia disse, eu não tenho competências nem apetências para o assunto. Tenho só a mania de escrever tudo que me vem à alma e às vezes à cabeça.

É uma mania que tenho de pequenina, gosto de pôr preto no branco o que penso e essencialmente o que sinto. Geralmente para mim e não para os outros. Não escrevo nunca para me ouvirem, muito menos para me sentirem. Não escrevo porque tenho veia ou inspiração, sabedoria ou vocação. Escrevo porque preciso e já agora porque percebi que houve alturas em que me soube bem saber que não estava sozinha com os meus botões, com os meus sentimentos, com a minha agonia, com as minhas dores. Havia alguém, algures que já tinha sentido também e eu li.

Este foi um dos textos de leitura fácil que me soube bem ler em várias alturas da minha vida:

"Às vezes é preciso aprender a perder, a ouvir e não responder, a falar sem nada dizer,
a esconder o que mais queremos mostrar, a dar sem receber, sem cobrar, sem reclamar.
Às vezes é preciso respirar fundo e esperar que o tempo nos indique o momento certo para falar e então alinhar as ideias, usar a cabeça e esquecer o coração, dizer tudo o que se tem para dizer, não ter medo de dizer não, não esquecer nenhuma ideia, nenhum pormenor, deixar tudo bem claro em cima da mesa para que não restem dúvidas e não duvidar nunca daquilo que estamos a fazer.

E mesmo que a voz trema por dentro, há que fazê-la sair firme e serena, e mesmo que se oiça o coração bater desordeiramente fora do peito é preciso domá-lo, acalmá-lo, ordenar-lhe que bata mais devagar e faça menos alarido, e esperar, esperar que ele obedeça, que se esqueça, apagar-lhe a memória, o desejo, a saudade, a vontade.

Às vezes, é preciso partir antes do tempo, dizer: aquilo que mais se teme dizer, arrumar a casa e a cabeça, limpar a alma e prepará-la para um futuro incerto, acreditar que esse futuro é bom e afinal já está perto, apertar as mãos uma contra a outra e rezar a um Deus qualquer que nos dê força e serenidade. Pensar que o tempo está a nosso favor, que a vontade de mudar é sempre mais forte, que o destino e as circunstâncias se encarregarão de atenuar a nossa dor e de a transformar numa recordação ténue e fechada num passado sem retorno que teve o seu tempo e a sua época e que um dia também teve o seu fim.

Às vezes mais vale desistir do que insistir, esquecer do que querer, arrumar do que cultivar, anular do que desejar. No ar ficará para sempre a dúvida se fizemos bem, mas pelo menos temos a paz de ter feito aquilo que devia ser feito. Somos outra vez donos da nossa vida e tudo é outra vez mais fácil, mais simples, mais leve, melhor.

Às vezes é preciso mudar o que parece não ter solução, deitar tudo a baixo para voltar a construir do zero, bater com a porta e apanhar o último comboio no derradeiro momento e sem olhar para trás, abrir a janela e jogar tudo borda-fora, queimar cartas e fotografias, esquecer a voz e o cheiro, as mãos e a cor da pele, apagar a memória sem medo de a perder para sempre, esquecer tudo, cada momento, cada minuto, cada passo e cada palavra, cada promessa e cada desilusão, atirar com tudo para dentro de uma gaveta e deitar a chave fora, ou então pedir a alguém que guarde tudo num cofre e que a seguir esqueça o segredo.

Às vezes é preciso saber renunciar, não aceitar, não cooperar, não ouvir nem contemporizar, não pedir nem dar, não aceitar sem participar, sair pela porta da frente sem a fechar, pedir silêncio, paz e sossego, sem dor, sem tristeza e sem medo de partir. E partir para outro mundo, para outro lugar, mesmo quando o que mais queremos é ficar, permanecer, construir, investir, amar.

Porque quem parte é quem sabe para onde vai, quem escolhe o seu caminho e mesmo que não haja caminho porque o caminho se faz a andar, o sol, o vento, o céu e o cheiro do mar são os nossos guias, a única companhia, a certeza que fizemos bem e que não podia ser de outra maneira. Quem fica, fica a ver, a pensar, a meditar, a lembrar. Até se conformar e um dia então esquecer."

Margarida Rebelo Pinto

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

O que cada um lê


Podia mesmo escrever tudo o que me veio a cabeça quando li este texto. Poderia eventualmente ter graça.
Mas achei por bem nada dizer.

Ele vale por isso mesmo, alias como qualquer bom texto vale por tudo aquilo que nos vem à cabeça quando o lemos, vale pelo que conseguimos retirar dele, vale pelo que ele nos consegue transmitir que será a mim umas coisa e a outros, outras coisas, mesmo que a essência seja a mesma! É como as cores, como os poemas, como a fotografia. Fazemos deles histórias e esta, vale a pena não ser contada por mim e deixar que quem a leia faça a sua própria história.


“…Se o escultor despreza a argila, terá de modelar o vento. Se o teu amor despreza os sinais do
amor a pretexto de atingir a essência, o teu amor não passa de um palavreado. Não descuides
as felicitações, nem os presentes, nem os testemunhos. Serias capaz de amar a propriedade,
se fosses excluindo dela, um por um, como supérfluos, porque particulares demais, o moinho,
o rebanho, a casa? Como construir o amor, que é rosto lido através da urdidura, se não há
urdidura sobre a qual escrever?...”

“…Sem cerimonial de pedras, não haveria catedral.
Nem haverá amor sem cerimonial em vistas do amor. Eu só atinjo a essência da árvore se ela
modelou lentamente a terra segundo o cerimonial das raízes, do tronco e dos ramos. Nessa
altura, ela é una. Tal árvore e não uma outra.
Mas aquela acolá desdenha as trocas, que a haviam de fazer nascer. Ela procura no amor um
objecto capturável. E esse amor não tem significado algum.
Ela julga que o amor é presente que ela pode fechar nela. Se tu a amas, é porque ela te
conquistou. Ela fecha-te nela, convencida de enriquecer. Ora o amor não e tesouro a
conquistar, mas obrigação de parte a parte, fruto de um cerimonial aceite, rosto dos caminhos
da troca….”

(Antoine de Saint-Exupéry, in "Cidadela")

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

É urgente o amor.


É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.

É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos, muitas espadas,

É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.

Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.

Eugénio de Andrade

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Para ti

"Foi para ti
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo

Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que talhei
o sabor do sempre

Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só
amando de uma só vida"

Mia Couto, in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Não Digas Nada!


Não digas nada!
Nem mesmo a verdade
Há tanta suavidade em nada se dizer
E tudo se entender —
Tudo metade
De sentir e de ver...
Não digas nada
Deixa esquecer

Talvez que amanhã
Em outra paisagem
Digas que foi vã
Toda essa viagem
Até onde quis
Ser quem me agrada...
Mas ali fui feliz
Não digas nada.

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Paixão


Tenho a certeza que um dia eu vou conseguir dar uma lufada de ar fresco a este meu blog.

A chama esmoreceu mas não está apagada. Ela está lá, quente, pequena em combustão lenta.

Falta-lhe oxigénio, neste caso, paixão.

Sem paixão as coisas parecem indiferentes, andam sozinhas sem brilho, não são maravilhosas, não são especiais, não são boas nem más e como tal não ficam na nossa lembrança, não ficam nos poros, não respiram...

Tudo parece indiferente.

No outro dia apanhai uma frase que vou tentar repescar. Porque essa sim tem lógica e transpira razão.

Ora pois cá está ela: “Para fazer uma obra de arte não basta ter talento, não basta ter força, é preciso também viver um grande amor.” (Wolfgang Amadeus Mozart)

Uma obra-prima tem sempre uma grande paixão por trás. Não sei o que raio têm as paixões, ou o que libertam para mexer connosco e dar-nos tanta criatividade e energia.

Ai de quem me está a ler e não entender que uma paixão pode nada ter a ver com uma paixão de amor carnal, se bem que essas paixões também movem montanhas, cidades ou mesmo mundos. Estou a falar de paixão. Paixão pela vida, paixão pelas coisas que temos, que conseguimos, que nos aparecem sem darmos por isso, paixão de paixão por qualquer coisa ou por alguém. Paixão de admiração, de respeito, de afeição. Paixão de estima, de bem-querer, de afecto, de amizade, de beleza, de excelência, de perfeição…
Paixão, tão só paixão.

Ou sou dada a paixões. Eu apaixono-me com muita facilidade. Paixono-me por qualquer coisa, por qualquer pessoa, por qualquer situação. Adoro a vida, deixo-me levar por ela, adoro tudo o que me rodeia, adoro pessoas, adoro a natureza e os cheiros próprios de cada estação, adoro o sol, adoro a lua, adoro o mar, adoro a praia, adoro o campo, as flores, adoro a Primavera, adoro o Outono, a lareira, a madeira, adoro as texturas, as cores, o arco-íris, acho que sou uma eterna apaixonada.

Ser-se uma eterna apaixonada tem os seus prós e os seus contras, alias como tudo na vida.

Os apaixonados correm atrás, sobem alto, vão depressa e por isso encontram vários obstáculos rasteiros que os fazem tropeçar e cair. Os apaixonados são pessoas alegres/nostálgicas e nem sempre compreendidas mas, bem-feitas as contas têm muito mais a ganhar do que a perder, porque até no sofrimento e nas lágrimas são capazes de amar incondicionalmente.

"Paixão é uma infinidade de ilusões que serve de analgésico para a alma. As paixões são como ventanias que enfurnam as velas dos navios, fazendo-os navegar; outras vezes podem fazê-los naufragar, mas se não fossem elas, não haveriam viagens nem aventuras nem novas descobertas."
(Voltaire)

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Nem tudo o que parece é


Há tanta coisa que deixa de ter sentido ao longo da nossa vida! Eu mesma fico espantada com tudo o que muda de rumo.

Odeio mudar de rumo. Faz-me sentir insegura.

Odeio sentir-me insegura, faz-me sentir pequenina e indefesa.

O facto é que há coisas que mesmo que eu não goste, acontecem, que mesmo que eu não queira, são assim.

Nada está nas nossas mãos, por muito que às vezes assim pareça. É caso para dizer que nem tudo o que parece é.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011