sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Imortalidade

Escrever é de facto do caraças.

Quem diz escrever diz organizar o pensamento.

Sim porque para mim, escrever é organizar o pensamento. É por as palavras por ordem. É fazer com que elas tenham algum sentido. O sentido dos meus pensamentos, do meu sentir, dos meus gostos, das minhas mágoas, dos meus prazeres.

Está tudo dentro de uma caixinha prestes para sair cá para fora. Uma caixinha cheia de peças, um tanto ou quanto baralhadas, com as quais se podem construir coisas lindas ou então nada.

Quando se começa a tentar fazer o puzzle, a debitar palavra por palavra e a construir frases, parece que estas nunca saem como os sentimentos se sentem. E ai começam os sarilhos. Ou por outra a guerra das palavras.

É o escreve e descreve. Escreve de novo e muda. Apaga e torna a escrever. Até que por fim sai qualquer coisa. Qualquer coisa que nos soa bem. Qualquer coisa que está de acordo com aquilo que tínhamos cá dentro.

Quando isto acontece, alguma coisa muda dentro de nós. Não sei especificar o quê, mas que muda muda. Tira-nos um peso de cima. É o desabafo. É o alivio de deitar cá para fora um chorrilho de sentimentos que fazem parte da nossa vida e que queremos de alguma maneira partilhar. De nós para nós, de nós para quem queremos que nos oiça, de nós para quem nos quiser ouvir. É a materialização das nossas lágrimas, dos nossos risos, dos nossos abraços, beijos, gritos, dores, das nossas experiencias de vida vivida a sós.

Quem saberá o que sinto quando estou sozinha? Tenho frio.
Quem saberá o que sinto quando tenho um monte de gente à minha volta? Solidão.
Quem saberá o que sinto? O que os meus olhos choram? O que os meus ouvidos ouvem? O que as minhas mãos sentem? O que a minha alma grita? O que tenho dentro do meu coração? Qual é o cheiro e a voz que fazem parte do meu imaginário? O que está guardado no meu peito? O que digo no meu silencio?

Quando a minha mãe morreu uma das coisas que procurei desesperadamente foram os seus testemunhos. Aquilo que as palavras me poderia mostrar dela. Tinha esperança de encontrar aquilo que ela nunca me contou, que eu nunca soube, que nunca saberei.
Fui a todas as suas agendas, livros, computadores, folhas de papel, anotações em contas de farmácia.


Procurei, procurei palavras. Palavras que me confortassem que mostrassem a sua alma, a sua vida. A sua imortalidade.

É, parece que todos nós procuramos, de alguma forma, a

imortalidade.

Ele há coisas na vida, que nós só nos apercebemos quando escrevemos.

(Esperta como era também percebeu, que nunca poderia escrever nada sobre ela, sobe pena de poder parecer aquilo que não era, aquilo que ela não queria ser. Mais do ninguém sabia o verdadeiro poder das palavras. E o poder das próprias virgulas.
Ela Sabia aquilo que eu jamais saberei.)

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