segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O Sensacionismo



E porque, as pessoas estão tão ocupadas em parecer, que se esquecem completamente de ser e de sentir...

O Sensacionismo  

"Sentir é criar.
Sentir é pensar sem ideias, e por isso sentir é compreender, visto que o Universo não tem ideias.
- Mas o que é sentir?
Ter opiniões é não sentir.
Todas as nossas opiniões são dos outros.
Pensar é querer transmitir aos outros aquilo que se julga que se sente.
Só o que se pensa é que se pode comunicar aos outros. O que se sente não se pode comunicar. Só se pode comunicar o valor do que se sente. Só se pode fazer sentir o que se sente..."

Fernando Pessoa, in 'Sobre «Orpheu», Sensacionismo e Paùlismo'


sábado, 28 de janeiro de 2012

Cansaço

Não, não é cansaço...
É uma quantidade de desilusão
Que se me entranha na espécie de pensar,
E um domingo às avessas
Do sentimento,
Um feriado passado no abismo...

Não, cansaço não é...
É eu estar existindo
E também o mundo,
Com tudo aquilo que contém,
Como tudo aquilo que nele se desdobra
E afinal é a mesma coisa variada em cópias iguais.

Não. Cansaço por quê?
É uma sensação abstrata
Da vida concreta —
Qualquer coisa como um grito
Por dar,
Qualquer coisa como uma angústia
Por sofrer,
Ou por sofrer completamente,
Ou por sofrer como...
Sim, ou por sofrer como...
Isso mesmo, como...

Como quê?...
Se soubesse, não haveria em mim este falso cansaço.

(Ai, cegos que cantam na rua,
Que formidável realejo
Que é a guitarra de um, e a viola do outro, e a voz dela!)

Porque oiço, vejo.
Confesso: é cansaço!...

Álvaro de Campos, in "Poemas"
Heterónimo de Fernando Pessoa

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Solidão




Há qualquer coisa que me está a escapar.
As pessoas já não são as mesmas, as conversas estão diferentes, a disposição não é igual.
Mesmo a minha visão sobre o mundo que me rodeia começa devagarinho a mudar.
Aquilo que parecia ser, já não é. O que parecia seguro, morreu de velho. O bonito virou escuro. Não se fala, rosna-se.
Ontem quando amanhecia resplendecia, o que nascia era verdadeiro. Hoje o brilho está a desaparecer e já nada nasce, a surpresa deixou de nos pegar e a ingenuidade virou doença.  Tudo o que existe é velho e feio e, se é novo, é incipiente.
Tudo parece de plástico, descartável, frágil. O conceito virou “Usar e deitar fora” em todos os aspectos até mesmo com as pessoas e com os próprios dos sentimentos. Nada importa, nada conta, nada mexe. A preocupação de cada pessoa é ela própria e nada mais cabe no seu mundo. Deixou de haver o pensar nos outros, deixou de haver a preocupação por quem está ao lado. Aquela magia que nascia dentro de nós quando partilhávamos alegrias e tristezas, dores e gargalhadas, trabalhos e caminhadas é coisa rara de se ver. Já ninguém constrói em conjunto, partilhar já não é palavra de ordem pura e simplesmente porque ninguém para.
A vida corre como um rio, as margens hoje são umas, amanha são outras. É irrelevante passar por estas ou por aquelas. É preciso correr, porque na ânsia de se ser feliz, a pressa é a de chegar. Onde? Pois... Onde... Ninguém sabe, ninguém conhece, ninguém viu.
Mas eu vi. Eu vi a minha Avó feliz, eu vi a minha família viver, eu senti a vida a correr dentro de mim, eu fiz parte da construção que alguém cimentou e uniu. Eu vi. Eu senti. Eu falei, eu fui muro, fui janela, passei pela porta de alguém, sentei-me num banco e ouvi, e esperei, estive, participei, ri, partilhei, parti e reconstrui, chorei e falei, cai e levantaram-me. Eu fiz parte, eu também ajudei a construir. Juntos víamos o fundo do mar, fazíamos a nossa história, construíamos os nossos sonhos.
Agora não consigo conceber o mundo como ele está, não consigo digerir o que me rodeia, não consigo ver para além de hoje. O limite é ontem, não há sonho que persista nem fantasia que resista . A solidão aumenta, a tristeza anda estampada pelas ruas.
Viver não é correr é sentir.
Viver não é descartar é enfrentar.
Viver não é largar é agarrar.
Viver não é calar é falar.
É difícil viver sem sentir. É difícil sentir sem viver. 


“A Noite É Muito Escura É noite. A noite é muito escura. Numa casa a uma grande distância
Brilha a luz duma janela.
Vejo-a, e sinto-me humano dos pés à cabeça.
É curioso que toda a vida do indivíduo que ali mora, e que não sei quem é,
Atrai-me só por essa luz vista de longe.
Sem dúvida que a vida dele é real e ele tem cara, gestos, família e profissão.

Mas agora só me importa a luz da janela dele.
Apesar de a luz estar ali por ele a ter acendido,
A luz é a realidade imediata para mim.
Eu nunca passo para além da realidade imediata.
Para além da realidade imediata não há nada.
Se eu, de onde estou, só veio aquela luz,
Em relação à distância onde estou há só aquela luz.
O homem e a família dele são reais do lado de lá da janela.
Eu estou do lado de cá, a uma grande distância.
A luz apagou-se.
Que me importa que o homem continue a existir? “

Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"
Heterónimo de Fernando Pessoa

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Passos




 “Os passos são a forma mais clara de nos descrever.”...” Um passo é um acto, um gesto que por mais natural que seja envolve todos os teus sentidos, antes e depois.” 
(José F. Machado)


Um passo, dois passos uma caminhada. Fiquei curiosa e por isso incumbida de perceber e sentir o meu passo.

De facto assim numa primeira instancia posso dizer que me sinto mais insegura ou menos insegura, mais interessante ou menos interessante, sinto o caminho que quero levar ou não sei de todo para onde vou.

Num passo posso ainda sentir determinação, prepotência, segurança, posso sentir vontades e quereres, posso seguir ou fazer-me seguida.

Um passo um querer, um passo uma vontade, um passo um bocadinho de mim.

Passo por passo, um á frente do outro e o caminho  vai-se subtilmente iluminando, destampando devagarinho o manto da vida, deixando a nu, o mundo a meus pés.

O meu passo, o teu passo, o nosso passo , um conjunto de passos que se  aproximam, se cruzam e se afastam.

Não, um passo não é simplesmente um passo, é um passo...

Nele está todo o nosso ser, nele fica toda a nossa existência.

Nos passos do passado me reconheço, nos passos do presente me identifico, nos futuros ponho os meus sonhos. Eles estão à distancia de um só passo.


Um passo uma vida!

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Desencantos



No outro dia li uma frase que me ficou a matutar. É uma frase simples, nada filosófica na sua essência e que, assim à primeira vista, nada mais diz se não aquilo que diz. No entanto, o raio da frase, é plena de conteúdo. Ela aplica-se a situações que nunca me passariam pela cabeça aplica-la, mas a verdade é que desde que eu a li e passaram-se dois dias, ela tem-se ajustado vezes sem conta.

“Não se ama duas vezes a mesma mulher.”
Machado de Assis

Não é preciso rebuscar muito, nem falar sobre onde usei ou deixei de usar esta frase,  porque á medida que se vai falando sobre este ou aquele assunto ela vai surgindo, subtilmente. É engraçado perceber que há frases que envolvem palavras que não se vêm nem se ouvem mas que ficam, tão simplesmente, ditas.

Desencantado por um dia, desencantado para sempre e não há nada que se possa fazer. Cada vez mais acredito que não se deve deixar passar as nossas grandes oportunidades. Elas não voltam, nunca mais! Como a água que passa num rio!

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Mute




Agora sim, já percebi que uma coisa é pensar com a cabeça outra é pensar com o coração. Custou a chegar aqui.

O coração fechou temporariamente e a cabeça entrou em modo mute.

A razão é simples, pura defesa. Quando se sai de um quadro lindo mas sofrido, em que o coração manda na cabeça e não a deixa em paz com os seus “ses” e “mas”, quando se quer tudo menos entrar outra vez numa espiral sem retorno aparente, quando se está nos limites,  com um pé fora e outro dentro, quando finalmente o coração apesar de sofrer já consegue ter paz, aquela que não existia há muito... Então, a cabeça aproveita e aciona o tal modo mute.
 
Tudo quieto! Não vai lá atrás, não tenta ir lá a frente, não inventa, não faz filmes, não cria expectativas.

A intensidade de viver baixa drasticamente. A beleza da vida diminui, mas o coração para de sofrer, tem o descanso merecido.

Se é bom? Pois não sei, é no mínimo descansativo! Se é mau? Pois que também não sei, não se sente a vida, ela passa-nos por cima.

Sabemos que ela anda  algures por aí, que tem um montão de coisas fantásticas para nos dar, mas o medo de sofrer é maior. Muito maior.
 
Depois de tudo bem percebido e encaixado, o que se tem a fazer é deixar as coisas correrem.

sábado, 7 de janeiro de 2012

Não poder fazer nada dói




Há alturas da nossa vida em que já não é tanto a nossa dor que dói mas sim a dor  de ver a dor daqueles que gostamos.  Dói não a conseguir apaziguar, dói não a saber aquietar, dói não poder fazer nada.
Que Impotência...

A impotência dói!

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Mais Um Momento...


Mais um momento sem palavras!
Ou cheia delas...

Tão cheia delas que não sai nenhuma. Atropelam-se, apinham-se, baralham-se, querem tanto sair e todas ao mesmo tempo que acabam por se atrapalhar e esbarrar umas nas outras.
Assim não tenho outro remédio se não roubar as palavras de outros para mostrar o que sinto e o que me vai na alma.

"Foi um momento

O em que pousaste

Sobre o meu braço,

Num movimento

Mais de cansaço

Que pensamento,

A tua mão

E a retiraste.

Senti ou não ?



Não sei. Mas lembro

E sinto ainda

Qualquer memória

Fixa e corpórea

Onde pousaste

A mão que teve

Qualquer sentido

Incompreendido.

Mas tão de leve!...



Tudo isto é nada,

Mas numa estrada

Como é a vida

Há muita coisa Incompreendida...



Sei eu se quando

A tua mão

Senti pousando

‘Sobre o meu braço,

E um pouco, um pouco,

No coração,

Não houve um ritmo

Novo no espaço?

Como se tu,

Sem o querer,

Em mim tocasses

Para dizer

Qualquer mistério,

Súbito e etéreo,

Que nem soubesses

Que tinha ser.



Assim a brisa

Nos ramos diz

Sem o saber

Uma imprecisa

Coisa feliz."

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

Foi um momento




Não foi um momento, foram muitos os momentos.
A minha vida é feita deles.
Quantas vezes não os percebi na hora certa, quantos ainda não encaixei, quantos me fizeram felizes na própria altura...
Nem todos foram fáceis de entender, nem todos foram fáceis de viver, mas todos foram importantes.
Guardo os bons, guardo os que fizeram e fazem de mim aquilo que eu sou.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Acontece...


Aos poucos vamos ficando sem referencias e sem ninguém que nos ajude a criar bases e a reforçar as memórias.

Sem referências deixamos de ser uma família para passarmos a ser simplesmente nós. Nós e os mais novos.

As responsabilidades começam a pesar nos ombros e assim de repente começamos a ser nós os exemplos e os pilares dos que nos estão abaixo.

Acontece que ainda não me sinto à altura de uma tão grande responsabilidade. 

Acontece que ainda não tenho bagagem suficiente para poder ser um exemplo e duvido que algum dia venha a ter.

Acontece que eu ainda preciso perdidamente de alguém que me dê paz, me passe sabedoria, me ponha no colo, me abrace e me proteja, me passe a mão pela cabeça e me conte histórias.

Acontece que ainda preciso  desvairadamente de alguém que me dê ouvidos, que me diga o que fazer quando me sinto perdida, que me agarre quando quero fugir, que seja duro na critica e meigo no perdão.

Acontece que ainda não estou preparada para ser crescida!

Acontece que eu não quero que as coisas aconteçam assim!

Estou triste!